Please use this identifier to cite or link to this item: http://hdl.handle.net/10174/8559

Title: Pluralidade no Ensino do Instrumento Musical
Authors: Lopes, Eduardo
Editors: Lopes, Eduardo
Keywords: Música
Ensino de Instrumento
Issue Date: Feb-2013
Publisher: Fundação Luís de Molina
Citation: Lopes, Eduardo (Ed). 2013. Pluralidade no Ensino do Instrumento Musical, FLM
Abstract: Em Outubro de 1976, a Rádio Televisão Portuguesa começou a transmitir a série de ficção científica ‘Espaço: 1999’. Esta série produzida para o canal televisivo Britânico ITV, tornou-se um estrondoso sucesso a nível nacional, transportando os seus espectadores para um futuro repleto de tecnologia, vivências e situações nunca antes imaginadas. Eu próprio, há altura com idade representada com um só dígito, era um grande apreciador da série, ficando fascinado com a forma de comunicar à distância utilizada pelos personagens da série. Como nessa época tínhamos em casa um pesadíssimo telefone preto de baquelite com marcador de metal e ligação à parede por um cordão em material têxtil (hoje em dia uma fantástica peça vintage de museu), o ComLock que os personagens utilizavam para comunicar era algo que eu nunca imaginaria poder sequer existir no futuro. Utilizado à cintura, o ComLock era um pequeno objeto que para além de outras caraterísticas de transmissão de dados, servia principalmente para os personagens comunicarem sem fios à distância, com a particularidade de ter incorporado um pequeno visor, a preto-e-branco, em que se via a cara do interlocutor em tempo real. A realidade é que nos dias de hoje, muitos de nós têm no bolso um dispositivo tecnológico muito idêntico ao ComLock (ao qual chamamos Smartphone), com a vantagem de que recentemente quando falei em tempo real com uma colega na California, a imagem foi a cores. O que então para mim (e outros) em 1976 parecia impossível ser desenvolvido ou acontecer, sendo posicionado como mero produto da imaginação1 dos autores de uma série de ficção, é hoje uma realidade e já mesmo ultrapassada. Se no que respeita à tecnologia, a ficção científica acima descrita deu-nos uma clara noção do que poderia existir no futuro (assustadoramente não muito distante), poderemos talvez também tentar o mesmo exercício em relação à música. Em 1977 (um ano depois do início em Portugal de ‘Espaço: 1999’) e desta feita para as salas de cinema, estreia aquele que é para muitos o grande filme de ficção científica de todos os tempos. Produzido e realizado por George Lucas, ‘Star Wars Episode IV: A New Hope’ foi o primeiro de um conjunto de seis filmes, sendo considerado um marco da cinematografia internacional. Se bem que nunca indicado diretamente no filme, imaginamos que os eventos são passados num futuro muito distante dos dias de hoje, em que seres humanos, humanóides, criaturas extra-terrestres e robôs inteligentes vivem e coabitam no Universo. Utilizando um calendário ficcional chamado Coruscant Standard Calendar apenas sabemos que para os personagens este calendário tem o seu início no tempo da República Velha em 25053 BBY (Before the Battle of Yavin), e que os eventos do filme se passam no ano 0 ABY (After the Battle of Yavin). Mas para a ajudar a discussão em causa, atrevo-me a especular que poderemos imaginar que estamos a falar de um futuro, em relação aos dias de hoje, de cerca de 30000 anos. Uma das cenas do filme passa-se na cidade de Mos Eisley no planeta Tatooine. Nesta cidade, os personagens entram num bar (‘cantina’), e em breves momentos podemos observar e ouvir um grupo de músicos aparentando serem a ‘banda da casa’. De aspeto humanóide, este grupo musical chama-se Figrin D’an and the Modal Nodes e tem a formação de sete músicos que tocam uns instrumentos de sopro muito idênticos aos dos dias de hoje (essencialmente madeiras). A música de fundo interpretada por esta banda foi composta por John Williams, responsável também por toda a banda sonora do filme. É perfeitamente claro, que a música interpretada por este grupo é de estilo swing, similar ao de Benny Goodman da década (agora real) de 1930; tendo uma orquestração para trompete, saxofone, clarinete, piano elétrico, steel drum e percussão. Em comparação com a tecnologia de ficção apresentada neste filme, bem como na da série televisiva anteriormente discutida, a música não se apresenta ‘futurística’ – pelo menos no sentido de algo que está para além da nossa imaginação. Tendo tido o seu apogeu e estatuto de grande vanguarda musical nos anos 30, hoje em dia o estilo swing é já considerado do passado e com pouca expressão na atividade artística atual, na qual outras sonoridades e estéticas melhor representam a contemporaneidade. Não querendo adivinhar as discussões de trabalho entre Lucas e Williams, apontando talvez questões de extra-diegese ou mesmo meta- diegese da música no filme (ou simplesmente a sua função neste filme), talvez fosse espectável que uma representação de uma distância temporal de um futuro na ordem dos 30000 anos, não fosse uma sonoridade swing tão óbvia. A problemática que estamos então a abordar neste volume, e que constantemente está no imaginário de todos ligados de alguma forma a atividades musicais (desde a crítica musicológica, passando pela teoria e até à prática), é então como será a música de um futuro mais ou menos distante. Não sabemos exatamente se esta problemática preocupava Palestrina ou Bach, mas podemos adivinhar que estes compositores ficariam certamente surpresos com muita da música feita na atualidade, e que talvez esta estivesse mesmo para além da imaginação de cada um deles. No entanto, o exercício por mim efetuado de procurar possíveis expressões musicais do futuro através da ficção científica3, não considerou que na realidade se trata de ficção científica (i.e. ciência/tecnologia) e não ficção artística/musical - um género não muito comum numa concepção similar à ficção científica. Começando finalmente a descida à Terra, a preocupação com a música do futuro está intimamente ligada com a função, concepções e metodologias de ensino, pois de certa forma o que ensinamos no presente terá sempre um impacto (relativo é certo) no futuro. De que forma então as instituições de ensino de música participam no avanço e de certa forma progresso4 da arte? Têm as instituições de ensino estado um passo à frente no que respeita ao progresso da arte? Ou simplesmente respondem aos avanços e progressos da arte na sociedade? Ou será uma mistura das duas questões, havendo uma espécie de fenómeno de contínuo feedback? Sendo o conceito de ‘educação progressista’ de definição bastante difusa e não consensual, a sua forma mais generalista tende a indicar uma atitude pró-ativa para mudanças de prioridades educacionais (e de conteúdos) na sequência de novos paradigmas sociais e culturais5. Se bem que a definição mais abrangente de educação progressista parece indicar a priori um posicionamento da educação simplesmente como resposta aos avanços na sociedade, acreditamos que a sua essência pró-ativa também exerce influência na sociedade6. Assim sendo, uma educação progressista tende a influenciar e ser influenciada pelo contexto sócio-cultural onde se insere. Não será então de admirar que os conceitos de democracia, inclusividade e pluralidade sejam basilares numa educação progressista. Se bem que os conceitos de democracia, inclusividade e pluralidade também se aplicam à educação musical (sendo por natureza a educação artística terreno fértil para progresso e avanço), esta, por motivos variados, corre o constante risco de algum conservadorismo inerente a qualquer instituição de ensino8 (i.e. acomodação status quo). Para muitos musicólogos, a existência de um cânone da música de tradição europeia e a sua intrínseca ligação ao repertório dos programas de ensino de instrumento, tem resultado numa força que, de certa forma, tende a tornar mais lento o avanço e progresso do ensino da música. Com um corpus de repertório com cerca de quatrocentos anos que incluiu as dezenas de geniais compositores, resultando em centenas de obras de imenso valor artístico, que tempo restará então ao músico e aluno de instrumento para se debruçar sobre a musica da atualidade (e futuro)? Não podemos também esquecer que este cânone, se bem que com um atraso de algumas décadas, continua a crescer com a inclusão de outras obras que acabam por ganhar estatuto de obras- referência. Como o tempo normal de aprendizagem e estudo de um instrumento não tenderá a aumentar significativamente, será então que vamos começar a eliminar obras que antes ensinávamos, substituindo-as por outras mais recentes? Iremos ensinar as mesmas obras que hoje fazem parte do repertório daqui a trezentos anos? Quantas das obras de Bach deixaremos de fora, para podermos aprender e tocar obras-primas dos sécs. XX, XXI, XXII e XXIII? Se bem que estas perguntas são fáceis de formular, suas respostas já não são tão fáceis de apontar. Resta-nos então conjeturar que uma educação musical progressista (i.e. democrática, inclusiva e plural), em conjunto com os princípios de uma sociedade ativa e participativa, irá de facto ‘mover’ a música em sintonia com o futuro da humanidade. Seguindo nesta linha de idéias, o presente volume incluiu alguma investigação em várias áreas relevantes ao instrumento musical, refletindo sobre a problemática do seu ensino num futuro que cada vez mais se aproxima a largos passos. No primeiro capítulo, Ensino da Música em Portugal no Final do Antigo Regime: fatores de mudança e modernidade, Vanda de Sá oferece uma visão do ensino de música num período da história de Portugal. Neste capítulo poder-se-á notar de que forma algumas mudanças sociais introduziram no passado inclusividade no ensino (como por exemplo uma maior atenção a questões do género feminino), bem como iniciaram o desenvolvimento de metodologias e “instituições” de ensino de música. No segundo capítulo, Scordatura e Tablatura: do velho se faz novo, Paulo Vaz de Carvalho aborda a problemática da escrita para cordafones. Considerando exemplos históricos e comparando a eficácia e coerência das escritas para cordofones em tablatura, partitura e em partitura de falso efeito, é proposto um plano de procedimentos e ferramentas para ultrapassar o atual impasse da escrita para instrumentos em scordatura. No terceiro capítulo, Desenvolvimento no Estudo Sobre Instrumentos Musicais com Novas Tecnologias: exemplos de investigação, ensino e prática, Patrícia Lopes Bastos reflete sobre o papel da ciência e tecnologia na história do desenvolvimento dos instrumentos musicais. Neste capítulo são também apresentados alguns institutos e laboratórios que fazem investigação de alto nível sobre a construção e análise de caraterísticas de instrumentos musicais. No quarto capítulo, A Improvisação no Ensino do Instrumento: a herança de Benny Goodman, Paulo Gaspar aponta a improvisação jazzística como ferramenta acessória para o ensino do instrumento, tendo em conta os desafios colocados pela música da atualidade ao instrumentista contemporâneo. Partindo da figura histórica de Benny Goodman, é proposta uma metodologia que incluiu a improvisação jazzística como parte integrante e fundamental no ensino do clarinete. No quinto e último capítulo, O Género Musical na Identidade dos Instrumentos: o saxofone no séc. XX, Mário Marques e Eduardo Lopes abordam questões sobre a relação entre a identidade dos instrumentos musicais e o género musical onde estes primeiramente se inserem. Partindo do exemplo do saxofone, e de alguns músicos (e música) da sociedade atual, é proposta uma grande inclusividade e pluralidade cultural de base em todas as áreas da experiência musical, como forma crucial para uma integração dinâmica da música na contemporaneidade.
URI: http://hdl.handle.net/10174/8559
Type: book
Appears in Collections:MUS - Publicações - Livros

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